CERAS, o hospital de animais selvagens que devolve os seus pacientes à Natureza

CERAS, o hospital de animais selvagens que devolve os seus pacientes à Natureza

9 de Março, 2017 0

O Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens (CERAS) é um projeto do núcleo regional de Castelo Branco da Quercus, tendo como principal objetivo recuperar animais selvagens debilitados e devolvê-los à natureza.

O UniPlanet falou com o CERAS para conhecer melhor o trabalho realizado neste centro de recuperação.

UniPlanet (UP): Como nasceu o CERAS?

O CERAS foi fundado em fevereiro de 1999. Não existindo, nessa altura, nenhum centro de recuperação de fauna selvagem num raio de centenas de quilómetros e sendo uma necessidade premente a prestação, a tempo inteiro, de cuidados continuados à fauna afetada, um grupo de amantes de natureza, na sua maioria alunos da ESACB (Escola Superior Agrária de Castelo Branco) e membros da Quercus, lançaram mãos à obra e iniciaram este ambicioso projeto. Da vontade à realidade foi um passo e no dia 4 de fevereiro desse ano dava entrada um Mocho Galego, nas então recentes instalações do centro. Este viria a ser o primeiro de entre centenas de animais que chegam anualmente ao CERAS.
Nesse ano, entraram 30 animais no CERAS. Este número aumentou, gradualmente, ano após ano, até uma média de 300 animais ano. O trabalho voluntário no CERAS é um dos seus pilares desde 1998, ao longo destes 19 anos já recebeu mais de 2730 animais selvagens, contando com uma taxa de recuperação média de 60% de animais devolvidos à natureza.

UP: Que animais costumam receber e como chegam ao vosso Centro?

A grande maioria dos animais que recebemos no CERAS são aves. Desde pequenos pássaros a aves tão grandes como uma cegonha ou um abutre. Entram no centro muitas espécies diferentes de aves de rapina, sejam diurnas (águias e falcões, por exemplo), sejam noturnas (mochos e corujas). Ocasionalmente recebemos também alguns mamíferos, como morcegos ou raposas, e répteis, sobretudo cágados e tartarugas.
Os principais responsáveis pela chegada dos animais ao centro são as equipas do SEPNA (GNR). O ICNF, através dos vigilantes da natureza, também é responsável pela entrega de muitos animais, bem como as próprias pessoas que os encontram.

UP: Como é o dia-a-dia no CERAS?

O dia-a-dia no centro é muito preenchido. Diariamente, a alimentação e o tratamento de cada animal em recuperação são preparados e ajustados à evolução do caso clínico. Os animais que chegam ao centro são avaliados clinicamente, a fim de se descobrir a causa da entrada e estabelecer um plano de diagnóstico e tratamento. Para além de tarefas como a realização de radiografias ou necropsias e a análise de fezes dos animais, é necessário garantir a limpeza dos materiais e espaços utilizados e das instalações onde recuperam os animais. Existem muitas outras atividades que fazem parte do quotidiano do centro, como a gestão do biotério de roedores, estudos e projetos nas áreas de medicina-veterinária e biologia, a manutenção das instalações e – o melhor de tudo – a devolução à natureza dos animais que foi possível recuperar.

UP: Quantos animais estão ao vosso cuidado, de momento? Costumam dar-lhes nomes?

Neste momento encontram-se em recuperação 12 aves, de 7 espécies diferentes, e uma tartaruga terrestre. Apesar de mantermos um dia-a-dia muito preenchido, esta época do ano está associada a um menor número de admissões no centro, algo que mudará em breve com a chegada da Primavera.
É muito raro darmos um nome a um animal em recuperação e isso prende-se com o facto de serem animais selvagens que pretendemos devolver à natureza e evitar que se habituem a nós. Além disso e salvo algumas exceções, um animal selvagem para ser capturado tem necessariamente de estar doente (e em geral, muito doente) ou ser uma cria. No primeiro caso, temos de estar preparados para que nem todos os animais tenham uma recuperação possível e bem-sucedida, pelo que dar-lhes um nome é uma forma de aproximação tipicamente humana, que pode tornar uma perda mais dolorosa de aceitar. Ainda assim, alguns animais que se mantêm connosco por muito tempo ou alguns casos muito especiais acabam por receber um nome, como é o caso da Aloé, um abutre-preto irrecuperável (não poderá ser devolvido à natureza).

UP: Quais são as principais ameaças enfrentadas pelos animais que chegam ao CERAS?

Ainda que as principais ameaças variem consoante a altura do ano são quase exclusivamente antropogénicas. Por exemplo, três dos animais atualmente em recuperação no CERAS foram vítimas de tiro (um bufo-real, uma garça-branca-grande e uma águia-de-asa-redonda. Disparar sobre espécies protegidas é ilegal e havíamos notado um decréscimo de casos nos últimos anos, mas esta época venatória os números voltaram a subir e abarcando uma grande variedade de espécies. Outra das principais ameaças é a eletrocussão nas linhas elétricas. O prognóstico nestes casos é muito mau e a maioria das aves não resiste ou fica irrecuperável, como foi o caso da Aloé há vários anos e de uma águia-calçada o ano passado, que foi transferida para um parque biológico. O cativeiro ilegal de espécies protegidas continua a ser uma das principais causas de entrada nos centros de recuperação, bem como as colisões, seja com estruturas fixas (linhas, cercas, edifícios) ou móveis (atropelamentos).

UP: O que acontece aos vossos “pacientes” depois de recuperarem?

Depois de recuperarem vem, sem dúvida, a melhor parte: devolvê-los à natureza. Tentamos fazê-lo perto do local onde o animal foi encontrado, mas avaliamos cada caso em particular, consoante a época do ano, a espécie, a idade do animal e a razão pela qual entrou. É muito importante tentarmos trazer o máximo de pessoas para estes momentos tão especiais, aproveitando para fazer alguma educação ambiental e recompensar quem encontrou e entregou o animal no centro e que, por isso, foi tão ou mais importante que nós nesta segunda oportunidade.

UP: Quais são os maiores desafios para a reabilitação destes animais?

Enfrentamos vários desafios, um dos mais óbvios e interessantes é a diversidade de espécies que recebemos, cada qual com as suas particularidades, desde a forma como reage à presença humana à forma como se alimenta, por exemplo. Por outro lado, um centro de recuperação de animais selvagens não é lucrativo, bem pelo contrário, e os recursos financeiros são muito limitados. Assim, a gestão cuidadosa das despesas é uma tarefa muito desafiante, uma vez que pretendemos assegurar que os animais em reabilitação recebem os melhores tratamentos e alimentação possíveis.

UP: O que não devem as pessoas fazer quando encontram um animal selvagem ferido?

Ficar com o animal aos seus cuidados! Percebemos que a intenção é a melhor e até pode haver casos de sucesso, mas além do cativeiro de espécies protegidas autóctones ser ilegal, um centro de recuperação tem profissionais nas áreas de medicina veterinária e biologia, entre outras, que trabalham diariamente com muito empenho para alcançar o objetivo final que é a devolução à natureza do animal. Caso encontrem um animal ferido devem contactar a linha SOS AMBIENTE 808 200 520 ou diretamente a GNR/SEPNA local. Se por alguma razão, o animal tiver de ficar durante algumas horas com as pessoas que o encontraram, o mais correto é mantê-lo numa caixa de cartão ou semelhante, com furos, num ambiente escuro, ameno e tranquilo, sem lhe administrar nenhum tipo de alimento, água ou medicação.
Com a chegada da Primavera, algumas crias de diversas espécies – sobretudo andorinhas, andorinhões e corujas – vão cair dos seus ninhos, num processo que ocorre naturalmente após as primeiras tentativas de voo. O ideal é que sejam recolocadas nos seus ninhos, tão rapidamente quanto possível e com ajuda da GNR se necessário, para que os progenitores as continuem a alimentar, proteger e ensinar. Quando se confirma que as crias sejam órfãs ou na eminência de perigos, como predadores ou estradas, as crias devem então ser encaminhadas para um centro de recuperação.

UP: Querem apresentar-nos a vossa equipa?

A nossa equipa é constituída por quatro colaboradores do núcleo de Castelo Branco da Quercus de várias áreas desde a biologia, engenharia do ambiente, medicina-veterinária e comunicação.
Por estarmos envolvidos também em outros projetos da Quercus e por ser o trabalho no CERAS infindável, é fácil perceber a importância que damos aos nossos estagiários e voluntários. De momento, contamos com duas estagiárias espanholas da área de biologia e duas estagiárias do curso de cuidados veterinários, para além de vários voluntários!

UP: Quem pode ser voluntário no vosso Centro?

Qualquer pessoa pode ser voluntária no CERAS! Atualmente contamos com voluntários desde os 8 aos 60 anos, com formação em áreas tão variadas como arqueologia, fisioterapia ou inglês. Claro que o mais frequente é serem jovens das áreas de biologia ou enfermagem veterinária. Para ilustrar, a nossa voluntária mais assídua, responsável e entusiasta tem sido uma miúda de 13 anos!

UP: Como podemos apoiar o CERAS?

Existem diversas formas de apoiar o CERAS: tornando-se voluntário, apadrinhando um animal selvagem em recuperação, fazendo um donativo (em dinheiro ou em géneros) ou participando nas nossas atividades. Este ano, de 22 a 25 de Junho decorre o Ecofestival Salva a Terra, cujas receitas revertem a favor do centro. Apoiar esta causa pode ser tão simples quanto estar sensibilizado para as ameaças que os nossos animais selvagens enfrentam e partilhar a mensagem.


O UniPlanet recebeu um certificado de apadrinhamento!
Saiba como pode apadrinhar um animal selvagem aqui.

Contactos:

CERAS – Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens
Quinta da Senhora de Mércules
Castelo Branco
963957669 | 272324272
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