Barragens na bacia do Amazonas poderão causar danos “profundos” na natureza, diz estudo

Barragens na bacia do Amazonas poderão causar danos “profundos” na natureza, diz estudo

5 de Julho, 2017 0

A Amazónia

Na bacia do Amazonas – o maior e mais complexo sistema fluvial do mundo, que cobre mais de 6,1 milhões de km2 –, há planos para a construção de 428 barragens hidroelétricas, sendo que já existem 140 construídas ou em construção.

Um estudo recente, publicado na revista científica Nature, avisa que estas barragens poderão causar danos significativos e irreversíveis à bacia Amazónica e colocar milhares de espécies únicas em risco.

“O mundo vai perder a zona húmida mais rica em biodiversidade do planeta”, alertou Edgardo Latrubesse, professor da Universidade do Texas, em Austin, e autor do estudo.

“[Esta] é a bacia hidrográfica mais importante do planeta”, disse Victor Baker, coautor do estudo e professor da Universidade do Arizona. A água que flui pelos rios amazónicos equivale a 20% da água doce do planeta e as florestas circundantes contêm importantes ingredientes utilizados na medicina moderna.

A equipa de cientistas vê com particular preocupação a disrupção que os projetos hidroelétricos poderão causar no movimento natural dos sedimentos nos rios. Os rios da bacia hidrográfica do Amazonas movem-se como uma dança, trocando sedimentos e levando nutrientes a “um mosaico de zonas húmidas”, explica Edgardo Latrubesse.

Os sedimentos transportados pelos rios são uma fonte vital de nutrientes para a vida selvagem, contribuem para as provisões alimentares regionais e modulam a dinâmica dos rios. “É como os rios funcionam, como se movem, como regeneram a terra e como continuam a revigorar os ecossistemas”, disse.


Victoria amazonica, o maior nenúfar do mundo | Foto: Dick Culbert

Com as barragens, uma percentagem desses sedimentos ficará retida. “Os barrancos sofrem erosão, assim como as ilhas e partes da várzea, enquanto surgem novas áreas por sedimentação”, explica o investigador.

“Lembrem-se do antigo Egito, que dependia dos sedimentos do rio que fertilizavam as terras da planície de aluvião”, disse ao El País. “O Nilo é hoje um rio totalmente regulado de maneira artificial por megarrepresas. É um caso típico que exemplifica os enormes impactos provocados por infraestruturas construídas há várias décadas, que produziram grandes impactos sociais, ambientais e económicos.

Embora as avaliações ambientais tenham considerado partes do rio na proximidade imediata das barragens, Victor Baker defende que o sistema fluvial não pode “ser separado” e que é necessária uma avaliação em grande escala do impacto que as barragens teriam na bacia.

“O problema é que ninguém está a avaliar o pacote completo: a cascata de efeitos que as barragens produzem em todo o sistema”, comentou Edgardo Latrubesse.


Boto-cor-de-rosa, uma das espécies que vive na bacia do rio Amazonas | Foto: Michelle Bender

Para o seu estudo, a equipa desenvolveu um Índice de Vulnerabilidade Ambiental às Barragens para determinar os impactos atuais e possíveis destas infraestruturas nos rios amazónicos e nos seus ecossistemas. Os valores deste índice quantificam, numa escala de 0 a 100, a vulnerabilidade de uma zona às mudanças gerais causadas nos sistemas fluviais graças às barragens.

Os rios Marañón, Ucayali e Madeira (com um índice de 72, 61 e superior a 80, respetivamente) foram apontados no estudo como particularmente vulneráveis. “Todos estes rios apresentam níveis muito elevados de biodiversidade, com muitas espécies endémicas”, disse Edgardo Latrubesse. O rio Madeira é responsável por cerca de metade dos sedimentos totais do sistema do rio Amazonas e é casa da população de peixes mais biodiversa do Amazonas. Foram recentemente construídas neste rio duas grandes barragens que resultaram numa diminuição de 20% da concentração média de sedimentos.

Se apenas uma fração das barragens propostas for construída, os investigadores temem que milhares de espécies poderão ser afetadas, até talvez ficar extintas.

Os cientistas avisam também que os danos poderão ser irreversíveis e que todos os riscos devem ser considerados antes de se avançar com os planos das barragens.

1ª foto: Neil Palmer/CIAT

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